terça-feira, 14 de julho de 2009

Sobre Câmeras (parte 2)

O ministério da saúde adverte: ler a parte 2 sem ter lido previamente a parte 1 pode causar câncer, impotência sexual, perda de memória, perda de memória, queda de pêlos pubianos, enfim...

Sem mais, a parte 2:

A pobre senhora, fazia figas com os dedos das mãos e dos pés, rezando para que a filha não estivesse fumando. Aparentemente as superstições deram certo, pois não a encontrou com cigarros. No entanto, a encontrou coabitando com um garoto. Empalideceu na hora, deixando o controle remoto cair e se desfalecer sobre o piso de taco antiqüíssimo.

O baque chamou a atenção das visitas, que olharam para o controle remoto espatifado no chão. Foram subindo o olhar pelo corpo nada interessante de Margaret, até chegarem na TV.

Bernardo riu-se na cozinha e foi ver o que estarrecia a todos. Perdeu a fala ao ver as imagens de sua filha tendo relações amorosas numa tela widescreen de 42 polegadas. Em seguida perdeu o fôlego e a reação.

O casal estava passando pela maior humilhação de suas vidas na frente das visitas, que assistiam consternadas à pornochanchada.

Margaret transtornada soltou um grito estridente ao marido, pedindo que fizesse algo. Bernardo, já rubro, saiu a passos de gigante rumo ao quarto da garota. A mulher foi por outro lado.

O operário enfurecido esmurrava a porta do quarto da filha soltando fogo pelas ventas e praguejando a tudo e a todos. Com um chute sólido, capaz de arrombar um cofre, destruiu a porta do cômodo, surpreendendo ambos na tentativa pífia de se vestir.

Quando entrou, foi como se o tempo tivesse parado. Parecia que tudo havia se transformado em gelatina laranja. As paredes se faziam movimentos ondulatórios, o quarto havia sido inundado por sensações fortes.

Júlia estava assustada até a alma, suas lágrimas tinham medo de sair do olho e escorrer pela face. O coração do garoto estava mais eufórico que desfile de escola de samba. O pai, não conseguindo acreditar no que via, estava em vias de sofrer um desmaio.

Olhares. Olhares eram tudo o que havia naquele quarto. O silêncio foi cortado pelos brados de Bernardão, que clamou pela esposa. Praguejou-a, por ter sumido num momento daqueles.

domingo, 12 de julho de 2009

"se chamarem diga que eu saí"

Pelo que notei, falta um post meu aqui. Uma pena que não começarei com um texto criativo, bem planejado e que os prenda, caros leitores, à leitura. hahahaha, que citação mais formal ¬¬.
Bom, escrevo apenas para avisar que, se demorei para postar, demorarei mais ainda para retornar a fazê-lo. Ocorre que uma cidadezinha pacata, localizada na divisa de Alagoas com a Bahia me aguarda... Delmiro Gouveia, aí vou eu!

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Sobre Câmeras (parte 1)

As idéias de Julia a estavam assustando. A jovem não tinha mais controle sobre o que acontecia em sua mente. Estava ficando paranóica, mas tinha consciência plena disso. Sabia que seus temores estavam ficando cada vez mais exagerados, no entanto, ao invés de alertar alguém ou pedir ajuda, ela escrevia seus pensamentos em folhas, que não mostrava para ninguém.

Em não mais de uma semana após escrever algo, a menina queimava os papéis. Estes rituais estavam deixando suas roupas com um certo cheiro de fumaça, que levou a mãe da garota a crer que ela estava fumando.

Desconfiada, Margaret resolveu colocar uma câmera no quarto da jovem. Esperou, no dia seguinte, o horário de Júlia ir para a escola e entrou no cômodo. Era sombrio e nefasto. A decoração de menina havia sido substituída por pôsteres de bandas góticas, bem como a aparência, que agora era a de um castelo medieval.

Margaret era uma republicana conservadora e inveterada. Uns poucos cabelos grisalhos denotavam sua seriedade e sua experiência de vida. A mulher andava sempre usando vestidos, geralmente veludo cor-de-vinho. Seu apreço pelos “bons costumes” e todo o tradicionalismo que a cercava ao longo da vida justificam o pequeno delito.

Não enxergava seu ato como transgressão à privacidade de Júlia, mas como uma medida precavida de uma mãe preocupada. Pegou uma furadeira e criou quatro orifícios na parede gelada. Com parafusos e uma chave Philips fixou o objeto eletrônico em uma posição estratégica. Do lugar onde a câmera estava, era possível ter uma vista privilegiada do quarto sem correr o risco de ser percebida pela jovem.

Em seguida buscou um aspirador de pó, que só ligou após ter fechado a porta do dormitório da garota. Sabia que a jovem, ou tampouco o marido, chegariam naquele horário do dia, entretanto não se via confortável correndo qualquer risco. Era muito meticulosa no que fazia.

Deixou o quarto impecável, tirou suas digitais de tudo em que havia tocado e saiu para jogar fora a caixa do eletrônico.

À tarde chegou a filha, que ficou na sala até à noite, quando chegou o marido. Bernardo era um homem de quarenta e tantos anos, chegava em casa com um macacão sujo de graxa. Era um operário. Foi tomar um banho pois naquela noite especial receberiam visitas.

Os convidados eram o casal Bartolomeu e Jatira. Bartolomeu era um homem de estatura média-baixa, um tanto gordo e parcialmente calvo. Jatira era esguia, pescoçuda, mais reta que uma tábua-de-passar e dominada por rugas.

Os quatro adultos, já na meia-idade, conversavam coisas inúteis e chatas enquanto bebiam um chá sem açúcar suficiente e comiam bolachas maisena murchas.

Margaret notou que não via a filha já havia algum tempo. Preocupada com o que a jovem poderia estar fazendo, resolveu ligar a televisão. Apesar das condições da família, a TV havia sido uma “extravagância”, como Bernardo se orgulhava de dizer. Haviam comprado um televisor usado de plasma de 42 polegadas, era a “menina-dos-olhos” daquela residência, para não dizer daquele quarteirão, ou mesmo, de todo o bairro.

A mãe, inquieta, pegou o controle remoto, que ainda não sabia operar com muita prática e foi virando os canais. Após rodar três vezes por todos os canais existentes (e alguns inexistentes) a velha percebeu que estava fazendo alguma coisa errada. Forçou seus neurônios até conseguir se lembrar que deveria clicar em “AV”.